Alguns Modelos de Relatórios e Pareceres

AutorJorge Paulete Vanrell
Ocupação do AutorMedicina, Bacharelado em Ciências Jurídicas e Sociais e Licenciatura Plena em Pedagogia
Páginas725-778

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Introdução

Há uma tendência inexplicável à simplificação dos Relatórios (quer laudos, quer autos), e uma resistência inenarrável à elaboração de pareceres, por parte dos Médicos-Legistas.

É como se os Médicos-Legistas tivessem pressa em liberar-se do serviço que lhes foi cometido; urgência em passar a “batata quente” para as mãos de outros; falar e escrever menos, para errar menos e, assim, se comprometerem menos perante os operadores do Direito. Para quem observa de fora, pareceria que a maioria dos médicos-legistas tem medo de relatar os seus achados, receio de registrar o que veem, renegando, alto e bom som, o motivo princeps de sua função junto à Polícia Técnico-Científica, qual seja, o “visum et repertum”, esteio do labor pericial.

A alegação de acúmulo de serviços – como motivo para a simplificação dos Relatórios – não se afigura válida. Primeiro, porque os médicos-legistas (com raríssimas exceções) têm jornadas assaz longas, que os obrigam a permanecer à disposição do Instituto Médico Legal por no mínimo 40 (quarenta) horas semanais, tempo mais que suficiente para redigir muitos Relatórios, e de excelente qualidade. Segundo, porque o Relatório, por ser uma peça essencialmente descritiva, e por seu dever de evitar qualquer fonte de dúvida, não pode caracterizar-se pela sumariedade. Terceiro, porque um Relatório “enxuto” demais, via de regra, não tem serventia para o Poder Judiciário, e mais, o médico-legista não pode esquecer que sua atividade está intrinsecamente ligada à sua função de integrante da Polícia Judiciária. Quarto, porque um laudo “fraco, franzino e anêmico” de conteúdo, e na sua exposição, significaria um desserviço à Justiça, mostrando o pouco interesse de seu signatário em fazer parte dos quadros da Polícia Técnico-Científica. Quinto, porque, na presente fase de informatização das diversas dependências dos IMLs, não passaria de desculpa, pueril até, alegar dificuldade para digitar, corrigir e imprimir qualquer peça.

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Pari passu, a resistência dos médicos-legistas a elaborar pareceres, atribuída à observância da Resolução SSP-114, de 30.03.2001, não passa de mera desculpa para não terem de emitir opiniões, muitas vezes críticas, sobre os trabalhos de duvidosa qualidade de colegas inescrupulosos, de galenos mal preparados para um trabalho que veem apenas como “cabide de emprego”, e de profissionais incompetentes que relutam, relutam, estoicamente, a se debruçar sobre os livros.

Com o simples intuito de auxiliar aqueles poucos médicos-legistas, aos quais o “cachimbo já não lhes tenha entortado a boca...”, é que, para encerrar este trabalho, fizemos uma coletânea de laudos e pareceres – de autoria de diversos colegas da ativa –, que por sua elevada qualidade podem servir de fanal a direcionar os trabalhos dos mais novatos ou, até, daqueles que, embora com longa experiência burocrática, só agora decidiram melhorar a qualidade dos seus relatórios.

Não se trata, pois, de uma lista exaustiva nem fechada, e sim de um rol aleatório e aberto, onde os assuntos se atropelam “pêle-mêle”, exibindo desde laudos de necrópsia de ferimentos de projéteis de arma de fogo até laudos de exumação; desde laudos de necrópsia em casos de “overkill”, por ferimentos de instrumentos perfurocortantes, até laudos antropológicos de ossadas.

São meros modelos que, decerto, poderão ser amplamente modificados, aditados ou limitados em razão do uso e da prática adquirida.

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Projéteis de arma de fogo (homicídio)

Repartição - 4º D.P. Laudo nº .../20..

B.O. / I.P. - ......./20..

LAUDO DE EXAME DE CORPO DE DELITO

NECROSCÓPICO

Aos 05.12.20.., nesta Cidade de .................../..., a fim de atender a requisição do Dr. Delegado de Polí cia do Plantão Policial I, os infra-assinados, Médicos-Legistas do Instituto Médico Legal, procederam ao exame de corpo de delito em:

JOSÉ N. N.

para responder aos seguintes quesitos:

  1. - Houve morte?

  2. - Qual a causa?

  3. - Qual a natureza do agente, instrumento ou meio que a produziu?

  4. - Foi produzida por meio de veneno, fogo, explosivo, asfixia ou tortura, ou por outro meio insidioso ou cruel? (Resposta especificada)

Realizada a perícia, passaram a oferecer o seguinte LAUDO:

Examinamos no Necrotério deste IML, às 07h30 do dia de hoje, o cadáver que nos foi indicado como sendo:

1. QUALIFICAÇÃO

Nome: JOSÉ N. N.

Idade: 24 anos Sexo: masculino Cor: parda Estado Civil: solteiro

Pai: N/C Mãe: Rita de Tal Natural: Paranaíba, MS

RG: n/c Profissão: pedreiro Res.: Rua Parnaíba, nº 00 - SXXX (SP)

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2. HISTÓRICO: Segundo fomos informados pela Autoridade Po licial, a vítima teria resistido à ordem de prisão, atirando contra os Policiais Militares, ocasião em que, na troca de tiros, teria sido mortalmente ferido por disparos de arma de fogo, vindo a óbito no local.

3. VESTES: Jazia nu, no momento do exame.

4. REALIDADE DA MORTE: Evidenciavam-se, pelos clássicos sinais tanatológicos de certeza: a) imediatos: midríase paralítica bilateral, ausência de movimentos respiratórios e cardiocirculatórios, imobilidade e insensibilidade, e b) consecutivos: hipóstases fixas, hipotermia, rigidez cadavérica em instalação, desidratação de mucosas, depressibilidade do globo ocular e opacificação da córnea, entre outros.

5. EXAME EXTERNO: Verificamos tratar-se de cadáver de adulto, do sexo masculino, melano derma claro, de biótipo normolíneo, de compleição mediana, eutrófico, com idade aparentemente compatível com a da requisição. Cabeça: crânio simétrico, rosto oval, fronte curvilínea, cabelos ulótricos de colorido castanho-escuro, cílios e sobrancelhas castanho-escuras, olhos com íris castanhas, platirrino, boca de lábios médios, barba e bigode aparados, ortognato, orelhas normais. Dentes naturais, com falhas e em regular estado de conservação. Massa e estatura não medidos, devido a limitações técnicas. Pescoço: cilíndrico e simétrico. Tórax: simétrico, mamas tópicas. Abdome: Plano, cicatriz umbilical na linha mediana, distribuição pilosa própria do sexo masculino. Região dorso-lombo-sacro-coccígea: simétrica. Região genitoperineal e anal: simétrica e compatíveis com o sexo, ausência de sinais de violência. Membros: cilíndricos e simétricos, eutróficos, tatuagens localizadas nas regiões deltóideas: “tigre”, em cor-de-rosa, à direita; “castelo”, em cor verde, à esquerda. Notamos: 5.1 - Ferimento perfurocontuso, circular, de bordas regulares e invertidas, apresentando orlas de enxugo e contusão em volta, medindo 8,0 ± 0,5 mm de diâmetro, localizado na face anterior do pescoço, 3,0 cms abaixo da saliência da cartilagem tireóide da laringe (“pomo de Adão”) e 1,0 cm à esquerda da linha média, caracterizado como orifício de entrada de projétil de “arma de fogo”. 5.2 - Ferimento perfurocontuso, grosseiramente circular, de bordas irregulares e evertidas, sem orlas em volta, medindo 10,0 ± 0,5 mm de diâmetro, localizado na face lateral esquerda do pescoço, 4,5 cms abaixo do lobo auricular e 5,0 cms atrás da inserção do lobo auricular no crânio, compatível com orifício de saída de projétil de “arma de fogo”. 5.3 - Ferimento perfurocontuso, elíptico, de bordas regulares e invertidas, apresentando orlas de enxugo e

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contusão em volta, medindo 12,0 ± 0,5 mm, no eixo maior, e 8,0 ± 0,5 mm no eixo menor, localizado na face anterior direita do tórax, na altura da 4ª costela direita, na projeção da linha clavicular média direita, 6,0 cms à direita da linha média, caracterizado como orifício de entrada de projétil de “arma de fogo”. 5.4 - Ferimento perfurocontuso, elíptico, de bordas irregulares e evertidas, que se prolonga em escoriação, medindo 30,0 ± 0,5 mm, no eixo maior, e 10,0 ± 0,5 mm no eixo menor, localizado na face anterior direita do tórax, na altura da 5ª costela direita, na projeção da linha clavicular média direita, 6,0 cms à direita da linha média e 1,0 cm abaixo e medial em relação à lesão descrita em 5.3, caracterizado como orifício de saída tangencial de projétil de “arma de fogo”. 5.5 - Ferimento perfurocontuso, circular, de bordas regulares e invertidas, apresentando orlas de enxugo e contusão em volta, medindo 8,0 ± 0,5 mm de diâmetro, localizado na face anterior do abdome superior, na região epigástrica, 2,0 cms abaixo da apófise xifóide, na linha média, caracterizado como orifício de entrada de projétil de “arma de fogo”. 5.6 - Ferimento perfurocontuso, circular, de bordas regulares e invertidas, apresentando orlas de enxugo e contusão em volta, medindo 8,0 ± 0,5 mm de diâmetro, localizado na metade lateral prega glútea esquerda, isto é, 6,0 cms à esquerda da linha média do segmento, caracterizado como orifício de entrada de projétil de “arma de fogo”. 5.7 - Ferimento perfurocontuso, elíptico, de bordas regulares e invertidas, apresentando orlas de enxugo e contusão em volta, medindo 12,0 ± 0,5 mm, no eixo maior, e 8,0 ± 0,5 mm no eixo menor, localizado na face medial do joelho esquerdo, na transição com o terço distal da coxa esquerda, caracterizado como orifício de entrada de projétil de “arma de fogo”. 5.8 - Ferimento perfurocontuso, elíptico, de bordas irregulares e evertidas, medindo 12,0 ± 0,5 mm, no eixo maior, e 8,0 ± 0,5 mm no eixo menor, localizado na face posterior ou dorsal da coxa esquerda, na linha mediana do segmento, 6,0 cms abaixo da prega glútea ipsilateral, caracterizado como orifício de saída de projétil de “arma de fogo”. 5.9 - Ferimento perfurocontuso, circular, de bordas regulares e invertidas, apresentando orlas de enxugo e contusão em volta, medindo 8,0 ± 0,5 mm de diâmetro, localizado na...

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