O Exame Necroscópico 'In Concreto' - A Necrópsia Médico-legal

AutorJorge Paulete Vanrell
Ocupação do AutorMedicina, Bacharelado em Ciências Jurídicas e Sociais e Licenciatura Plena em Pedagogia
Páginas329-345

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Normas gerais para a realização da necrópsia

Para muitos, pode parecer que a realização de uma necrópsia não passa de uma retalhação, mais ou menos ordenada, do cadáver. Todavia, a realização de um Exame Necroscópico correto implica, não apenas conceitualmente, mas na prática também, muito mais do que o simples encontro com um corpo sobre a mesa do necrotério, sobre o qual se procede à dissecação.

Com efeito, eis que – parafraseando BORGES et al (op. cit.) “o caminho a ser percorrido de modo a atingir resultados satisfatórios, começa muito antes da primeira incisão que corta a pele e termina bastante depois do último ponto de sutura, quando da recomposição do cadáver” (BORGES et al, 1989).

Visando uma sistematização do procedimento a ser seguido, podem distinguir-se ao menos cinco etapas fundamentais, a saber:

• perinecroscopia ou levantamento do cadáver no local; • exame externo do corpo; • exame interno do corpo; • seleção, colheita e remessa de amostras para exames complementares; • elaboração do Relatório (Laudo ou Auto).

Destas, a primeira já foi motivo de amplo estudo na seção reservada ao estudo dos “Mecanismos da Morte” (cf. retro).

Nas demais, parece-nos que a orientação de BONNET (op. cit.) é a mais adequada para manter a ordem, a harmonia e tirar o máximo proveito do exame pericial, seguindo quatro normais fundamentais:

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  1. Que a necrópsia seja completa

Todos os órgãos e sistemas deverão ser examinados cuidadosamente, não se negando importância, a priori, a nenhum segmento da economia.

b) Que a necrópsia seja metódica

A necrópsia se realizará com a técnica que, por prática e preferência individual, seja a mais confiável para o médico-legista. Não existe uma única maneira de se desenvolver a técnica. Qualquer uma pode ser útil, com a condição de que o exame seja completo, não se desprezando de antemão aspectos que, ao final, podem ser importantes.

c) Que a necrópsia seja feita sistematicamente

Em todos os casos em que a causa mortis não apareça claramente dos fatos que se observam em um primeiro exame perfunctório, o exame necroscópico deve ser feito de maneira completa e com a melhor técnica. É dessa forma que podem observar-se concausas eficientes, mas ocultas, e/ou causas supervenientes e atípicas.

d) Que a necrópsia seja ilustrativa

Por menores que sejam os achados e por mais intranscendentes que possam parecer, ou que “deveriam” dar-se por óbvios, da mesma forma hão de ser consignados expressamente. Poder-se-ão acrescentar croquis, diagramas, desenhos, fotografias, radiografias etc., de tal sorte que, ao serem propostas as conclusões, estas exsurjam natural, racional e cientificamente válidas a partir dos elementos semiológicos ou propedêuticos que sustentem tais diagnósticos médico-legais.

Exame externo

O exame externo consistirá em uma sequência de procedimentos, os quais antecederão o contato direto do médico-legista com o cadáver. A forma como o exame externo se realiza não deve, necessariamente, seguir uma sequência preestabelecida, mas há de ter como finalidade sistematizar a pesquisa, evitando que algum dado possa escapar da observação e assim, involuntariamente, ser omitido. De acordo com a orientação de SIMONIN (op.cit.), teremos:

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1. Identificação. Exame dos sinais descritivos da pessoa, notadamente os que se direcionam à sua eventual identificação, como, por exemplo, cor e tipo de cabelo, cor da íris, estado e peculiaridades da dentadura, cicatrizes, tatuagens, estigmas profissionais, marcas particulares, nevos, malformações e deformidades de toda ordem etc., além da coleta de impressões digitais para dirimir eventuais futuros conflitos de identidade.

2. Descrição das vestes. Esse exame compreenderá um inventário das roupas que o cadáver apresenta, fazendo-se especial referência às etiquetas, cor e padrão de estampa, e, quando for o caso, tipo de tecido, esgarçamentos, vestígios de sangue, sêmen, fumaça, pólvora, queimaduras, solução de continuidade e sua correspondência com eventuais lesões corporais etc.

3. Realidade da morte. Consiste na verificação da presença dos sinais tanatológicos imediatos da realidade da morte (ausência de respiração e circulação, midríase, abolição do tônus muscular), bem como os consecutivos (desidratação, esfriamento, hipóstases, rigidez).

4. Sinais externos de valor médico-legal. Corresponde ao exame clínico e/ou instrumental das lesões corporais externas e sua descrição minuciosa, bem como à procura de vestígios aderidos à pele (resíduos de pólvora, manchas de sangue, saliva ou esperma, pelos etc.). Sempre que possível, deverá proceder-se ao registro fotográfico dos achados, ad perpetuam rei memoriam, ou, na sua falta, traçar croquis, desenhos ou esquemas do que foi observado.

- Sinais relativos ao meio em que permaneceu o cadáver. Quando o corpo permaneceu ao ar livre não costumam existir dados significativos, exceto os decorrentes das transformações putrefativas e da ação de predadores (roedores, mamíferos, aves etc.). Em outras situações, a mumificação, saponificação e maceração, locais ou gerais, podem proporcionar orientações com relação ao local. Algo semelhante se observa em alguns casos de soterramento, em que o meio (argila, gesso, farinha, cimento, cereais etc.) pode encontrar-se sobre o...

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