A Experiência de Desastres em Massa no Peru
| Autor | Jorge Paulete Vanrell |
| Ocupação do Autor | Medicina, Bacharelado em Ciências Jurídicas e Sociais e Licenciatura Plena em Pedagogia |
| Páginas | 513-529 |
Page 513
No Peru, a Odontologia Legal ou Forense inicia-se tardiamente em relação a outros países da América Latina, mais exatamente na década de 1960. A disciplina deixou de ter um valor essencialmente acadêmico, odonto-jurídico e individual, passando a ocupar um primeiro plano na colaboração em sucessivos desastres multipessoais.
Identificar os corpos mutilados e carbonizados, produto dos acidentes aéreos ocorridos naquela época, era um trabalho constante dos Odontólogos do Laboratório de Criminalística da Polícia Nacional do Peru (antes, Polícia de Investigações).
Um dos primeiros grandes trabalhos foi o caso Varig, ocorrido em 27 de novembro de 1962, quando um avião da Companhia aérea “VARIG” caiu nas proximidades da cidade de Lima, com 94 pessoas a bordo, entre passageiros e tripulantes. Todas, pela ação do impacto violento, de um lado, e do fogo devastador, de outro, ficaram reduzidas a massas carbonizadas, praticamente irreconhecíveis. Contudo, a maioria dos cadáveres foi identificada pelo método de Homologação das Fichas Odontológicas ante mortem e post mortem.
Identificar, em grau de certeza, restos humanos carbonizados e mutilados, é tarefa de muita responsabilidade para toda uma plêiade de pessoal especializado.
Como é de trivial sabença, o método, a técnica e os procedimentos de identificação dependem do estado em que se encontrem os restos humanos. Aqueles que contem com documentos e objetos pessoais facilitam sua identificação, as vítimas que apresentam cristas papilares aproveitáveis nos seus quirodáctilos contribuem com a identificação dactiloscópica convencional; mas aquelas citadas, isto é, os carbonizados, os mutilados etc., exigem a presença do Odontólogo Forense ou Odontolegista, de modo a aplicar os métodos
Page 514
próprios como a comparação de odontogramas, a superposição de imagens e a extração da polpa dentária para o exame de ADN.
Em 15 de junho de 1963, pela Resolução Ministerial nº 2264, foi criada a Seção de Odontologia Forense, regulamentada pela Resolução de Diretoria nº 608-IVO, de 08 de julho do mesmo ano, no Laboratório de Criminalística da Polícia Nacional. Tal fato constitui um marco significativo na história da Odontologia Forense no Peru.
Os desastres, como é curial, com frequência ultrapassam a capacidade do Estado e dos sistemas locais que se encarregam de cuidar dos falecidos.
A falta de assistência ou de planejamento especializado para as situações com vítimas em massa fomenta ainda mais os problemas, e não raro provoca o manejo inadequado dos cadáveres.
O tratamento que recebam as vítimas, nesse momento, tem um efeito profundo e duradouro na saúde mental dos sobreviventes e das comunidades, podendo ter sérias implicações no futuro. Da mesma forma, a correta identificação dos mortos tem uma inquestionável importância legal para os herdeiros, bem como para as companhias seguradoras, e pode ter serias repercussões sobre os familiares ainda muitos anos após o desastre.
Na seguinte relação são apontados os desastres naturais e não naturais de maior impacto social ocorridos no Peru, requerendo-se a presença dos peritos para auxiliar na identificação.
- 1962: Novembro/ Avião da Varig: 94 pessoas falecidas – Lima.
- 1962: Abril / Avião da Faucett: 18 pessoas falecidas – Tingo María.
- 1962: Agosto / Centro do país: 7 pessoas falecidas.
- 1964: Maio / Avião da Cia. Correo Aéreo Militar de Argentina: 49 pessoas falecidas (Lima).
- 1966: Abril/ Avião da Lansa: 49 pessoas falecidas – Chilca.
- 1967: Avião da Faucett: 66 pessoas falecidas.
- 1967: Avião da Varig: 101 pessoas falecidas – Norte de Lima.
Page 515
- 1968: Avião da Faucett: 28 pessoas falecidas – Huamachuco.
- 1970: Avião da Lansa: 99 pessoas falecidas – Cuzco.
- 1971: Avião da Lansa: 91 pessoas falecidas – 1 sobrevive (Juliana Koepcke) – Pucallpa.
- 1976: Avião da Faucett: 20 pessoas falecidas – Trujillo.
- 1987: Avião Focker da Marinha de Guerra: 43 pessoas falecidas. Equipe de Futebol AL (Lima).
- 1988: Avião Focker da AeroPeru: 12 pessoas falecidas – Juliaca.
- 1990: Avião particular: 9 pessoas falecidas – na Selva.
- 1992: Hidroavião FAP: 9 pessoas falecidas – Loreto.
- 1994: Vôo comercial fretado: 31 pessoas falecidas – Huanuco.
- 1996: Avião da Faucett: 123 pessoas falecidas – Arequipa.
- 1996: Avião de AeroPeru cai no mar: 70 pessoas falecidas – Chancay/ Lima.
- 1998: Avião FAP se choca: 28 pessoas falecidas – Piura.
- 1998: Avião FAP se choca: 74 pessoas falecidas – Andoas.
- 2001: Incêndio em Mesa Redonda: 280 pessoas falecidas, 180 desaparecidas –Cercado de Lima.
- 2003: Avião da Tans: 46 pessoas falecidas – Chachapoyas.
- 2007: Sismo Intensidade 7.0 M1, 7.9 MW. Duração: 4 minutos. 596 pessoas falecidas (Pisco/ICA).
No ano de 2000 foi realizado um trabalho de investigação científica, “El odontograma PNP como instrumento legal en la identificación de cadáveres NN en el Peru”, cujo propósito era dar publicidade aos benefícios da aplicação do método por homologação, utilizando o odontograma na identificação de cadáveres desconhecidos.
Para possibilitar a avaliação, foram tomados como amostra 11 acidentes aéreos, ocorridos no Peru, entre os anos de 1962 e 1996, em um total de 584 ocupantes, quando pereceram 579 pessoas, conseguindo sobreviver 05 passageiros, como mostra o Quadro nº 01.
Page 516
No Quadro nº 02, por não se contar com informação completa, não se levou em consideração o caso LANSA-1971, nem o de Juliaca em 1988, observando-se um total de 418 vítimas fatais, das quais 368 foram identificadas e 50 permaneceram como NN (lat. nomen nescio, nome desconhecido) ou desconhecidos.
Page 517
No Quadro nº 03 verifica-se que, de 368 cadáveres identificados, em 116 isso foi possível pelo método de homologação do odontograma.
Page 518
Para a identificação das vítimas, mister estabelecer uma ressalva: várias dessas vítimas tiveram sua identidade reconhecida por mais de um método de identificação (roupas, joias etc.), sendo certo que o método odontográfico, neste estudo, demonstrou ser o de maior credibilidade, por ser um método técnico-científico e não meramente empírico.
Das 418 vítimas, 116 foram identificadas pelo método odontográfico, ao passo que apenas 83...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO